17 dez, 2020

Por Dora Gurfinkel Haratz

Viva!

A velhice é um estágio do ser que nos cabe a todos, se tivermos sorte.

Podemos ser diferentes quanto à raça, cor, crença, escolhas sexuais, mas todos nós somos ou seremos velhos… um dia.
A cada dia que passa a questão do “envelhecer” mais nos angustia e pior, vem se antecipando. Quanto preconceito e falta de lucidez existe nessa “classificação”.

Parece que fomos ficando ultrapassados como coisas. Assim como… celulares. Há sempre uma versão mais nova e vamos nos sentindo “caducos”, embora ainda funcionemos muito bem.

É isso, o tempo passando, a cada dia mais rápido, nos deixando uma sensação de impotência, como areia que escorre entre os dedos. A ampulheta nos apontando para sua metáfora.

Ele, o tempo, começa a nos faltar e, paradoxalmente, nos sobra. E suas evidências já se fazem sentir em nós desde cedo.

Se for uma crise, nos deixará mudados. Se para pior ou para melhor, só nós podemos decidir… Exigências se modificam. Passamos a privilegiar mentes brilhantes a peles brilhantes. Valores vão sendo questionados e modificados.

Inúmeros fatores estão aqui envolvidos e eles são tantos! Biológicos, cronológicos, psicológicos, sociais… além dos pessoais. Uma verdadeira Babel em nós.

De repente nos vemos transformados na resultante de uma grande mistura de identificações, após algumas décadas de vida.
Somos aquele que fomos, aquele que gostaríamos de ser e, também, aquele que realmente somos neste exato momento.

É preciso ter cuidado conosco, diante da impossibilidade de nos vermos como somos, dada nossa natureza que é a humana. Freud nos lembra de que na mais primitiva história do sujeito, ele precisa de um outro que o reconheça, o nomeie, que o ame, enfim. Esta seria uma questão de sobrevivência. Aí, entendida como amor.

Mas… espere: isto era “antigamente”!

Neste momento a questão é outra. É de autoestima que se trata aqui.

Hoje já podemos contar com nossa “independência”. Já trazemos conosco este olhar.

Quanto tempo nos restará, o que queremos e podemos alcançar, onde estão nossos interesses e apostas. Estas questões são muito importantes e só nós, contando com nossa autoestima podemos responder.

Se as deixarmos nas mãos do “próximo”, ficaremos distantes de nós. Sejamos nós velhos de 20 ou 90 anos.

O tempo que passamos conosco e com outros, a imagem que temos de nós mesmos a partir das relações que vivemos, devem poder nos bastar para nos assegurarmos de QUEM somos.

As questões do Amor aí se localizam também, penso eu.

Amor pelo outro, amor por si mesmo…

De repente lembro-me dos Beatles (que na época me pareciam tão velhos…). Na música “When I´m 64” de 1967, cantavam: “Will you still need me… when I´m 64?” (você ainda precisará de mim, quando eu tiver 64 anos?).

Nesta simpática música, questionavam se a amada continuaria a querê-los depois dos 64 anos. Quer dizer: quando estivessem “velhos” e Paul McCartney só tinha 16 anos… Imaginem!

Vemos aí o medo da solidão também na velhice, como uma reedição.

Não. Não seremos lançados à solidão necessariamente por não sermos mais tão jovens. Pelo menos, nenhum dos Beatles ficou…

Por outro lado, até mesmo os “mais jovens” têm se sentido solitários.

Mídias sociais, redes e outros meios têm podido facilitar nossa comunicação. É só sabermos usá-las bem, isto é: a nosso favor.

Nada substitui a alegria do encontro, que nos mantém ativos, animados e vivos. É verdade… também.

“O sentido da prosa” pode ter até adquirido múltiplas formas. Viva a comunicação!

Mas continuaremos sendo sempre seres desejantes… de Vida.

Portanto, aqui entre nós, não perca seu precioso tempo com falsas questões, como a de “ser ou não ser… velho”.