23 mar, 2021

Por Betania Tanure

As claras em neve e o que você pode fazer

A importância de os executivos assumirem suas fragilidades nesse momento

Alguns devem lembrar-se dos deliciosos quitutes preparados nas cozinhas de cidades do interior em sua infância. Faz parte dessa memória o som da batida das claras de ovos, usadas em várias receitas… Com poucas claras, que quase passavam despercebidas na cozinha, fazia-se uma belíssima e volumosa espuma branca. Bela, mas bastante frágil. A clara em neve começa a murchar logo depois de pronta. Falta-lhe densidade e consistência para sustentar seu tamanho e beleza.

No cenário de hoje, de piora sem freio dos números da covid-19 e com muitas pessoas se comportando como claras em neve, corremos o risco de perder força, esperança e vida. Este é um momento dramático. de dor de tantas famílias é ensurdecedor e o ambiente empresarial mostra-se tenso e difícil, tanto do ponto de vista objetivo quanto do subjetivo. O ambiente institucional, nem se diga! Alguns parecem estar em Marte.

Não se pode tratar essas perdas como se fizessem parte do cenário. O momento pede nossa urgente indignação. Vivemos uma crise radical, complexa, recheada de uma terrível incerteza sobre muitas de suas dimensões. Temos de nos mobilizar e agir!

Esta semana ouvi do presidente de uma empresa, líder no seu setor, o seguinte comentário: “As pessoas estão enlouquecendo. Algumas negam a gravidade da situação, outras estão paralisadas pelo medo. A grande maioria tem uma ansiedade e uma instabilidade emocional terríveis. Nós (executivos) não fomos treinados para lidar com isso”.

Posso afirmar que essa é a realidade em muitas organizações. Perde-se o eixo, e um dos efeitos é que questões simples, banais, tomam dimensão de ofensa pessoal. Para a maioria dos executivos faltam instrumentos que ajudem a lidar com isso.

Vou analisar ações que contribuem para o enfrentamento dessa situação. Nas empresas, deve-se mudar o fluxo natural das coisas no nível do negócio, da organização, das pessoas, mas sem esquecer que isso significa, muitas vezes, acelerar em direção oposta. No que se refere às pessoas, o líder deve encontrar soluções efetivas para reduzir a ansiedade e administrar a instabilidade emocional de seus liderados – e, claro, a sua própria.

Para ser um redutor do nível de ansiedade, o primeiro passo é admitir que existe o medo, sobretudo o de morrer, lembrando que executivos poderosos, pelo menos a maioria deles, se consideravam imortais. É hora de acolher, deixando de lado a ansiedade de motivar as pessoas com as estratégias clássicas, que além de ineficazes parecem, neste momento, neste momento, ridículas aos olhos dos liderados. É hora de reconhecer que a crise é grave em nível social, profissional e pessoal.

Uma das competências que contribuem para diminuir a instabilidade emocional é a plasticidade, definida como a flexibilidade para lidar com os desafios sem desmoronar ou sem deixar que o nível de irritação transborde.

Aqui, um parêntese: alguns insistem em chamar plasticidade de resiliência. Resisto a esse termo, pois inclui “aguentar o tranco”, o que é muito positivo, e voltar para o mesmo lugar, o que é terrível, pois significa que não se aprendeu nada com a experiência.

Em nível individual, há quem opte por meditação ou exercício físico e quem busque refúgio em outras áreas, a música por exemplo. Não importa quais são as estratégias, e sim que elas incluam ao mesmo tempo as dimensões do corpo (atenção à taxa de cortisol), da mente, do coração e da alma.

Nada simples, mas super possível. Quando alguém “estourar” com você, pense e reflita: isso me pertence ou é fruto da instabilidade do outro? Essa é uma pergunta de ouro, um exercício que pode ajudar você a manter o eixo e não sofrer com a instabilidade e a agressividade alheias. Um caminho complementar é se engajar em movimentos que visam o bem comum. Esse é um forte redutor da própria ansiedade e pode refletir positivamente em seus liderados.

Cuide-se! Se precisar de ajuda, não se acanhe, esta é a hora de buscá-la. Optar pelo apoio de profissionais não é sinal de fraqueza, é sinal de força. A situação é tensa, densa, grave. “Claras em neve” perdem logo a beleza e a consistência, não resolvem. É preciso criar caminhos mais efetivos. Se não começou a fazer isso, comece já!