31 ago, 2022

Por Betania Tanure

As culturas organizacionais estão desmanchando…

Chegou a hora! Enfim hoje vemos que se amplia a consciência do real impacto da pandemia na cultura e na estratégia de gestão das organizações.

Incrível a demora! É como se as pessoas estivessem adormecidas por meses e meses. Adormecidas no sofrimento pessoal, no trabalho domiciliar, na nova forma de conciliar suas rotinas, a pessoal, familiar e a profissional.

Não se pode ignorar os enormes benefícios do home office, da tecnologia, da nova realidade. Temos de aproveitá-los na sua potencialidade máxima. Estou “ligada” à lógica contemporânea, só não estaria se vivesse em Marte. E tenho dois filhos jovens, que trabalham em empresas jovens, aprendo com eles. Aliás, se você tem filhos, permita que o desafiem.

Mas, sinal vermelho: a cultura das organizações, ou de grande parte delas, está se desmanchando! Os valores sólidos que sustentam o jeito de ser e de fazer, entre eles os inegociáveis não explícitos, mas praticados, começam a perder cor. Equipes antes bem entrosadas se desarmonizam após contratações feitas durante a pandemia, e a gestão do conhecimento toma o mesmo caminho. Se há formas eficazes de melhorar isso? Sim! Temos ajudado empresas nesse sentido. Porém, é preciso compreender que não se obtêm resultados diferentes sem fazer diferente.

Algumas funções ou tarefas se desenvolvem melhor em um ambiente “solitário”, e identificar quais são elas é “o pulo do gato”. E vale considerar que, quando se discute a prevalência do uso de tecnologias, o desafio é grande e envolve o risco de sermos carimbados de antigos ou até ultrapassados.

Vou dividir com vocês alguns resultados de nossas pesquisas, que revelam tendências de alguns “grupos”. Deixei a abordagem sobre as pessoas da área de TI para outro artigo.

Grupo 1. Os mais seniores têm como valor o “face to face”. Querem e valorizam o trabalho presencial e estão, na maioria, inquietos com os efeitos do home office, mesmo sem ter argumentos que repercutam nas outras gerações.

Grupo 2. Os mais jovens, solteiros em sua maioria e em fase de construção de carreira, se dividem em dois grandes grupos: A) Aqueles que ambicionam o crescimento profissional, o aprendizado e almejam voos mais altos (às vezes com uma pressa disfuncional). “No presencial, aprendo mais e ainda ajudo o trabalho do outro a ser muito melhor” e “Valorizo a liberdade de poder fazer home office uma vez por semana”. Há uma mudança de paradigma no controle e na liberdade decisória, que é conciliada com a essência da organização e os rituais de gestão. A cola é a confiança, é o espaço seguro para trabalhar, inovar, errar e aprender. O valor da experiência é gigante. Este é um desafio megarrelevante: liberdade não significa ausência de regras. B) Aqueles cuja ambição de prazer ou conforto pessoal supera a profissional. Eles focam o benefício de não se deslocar e de conciliar atividades extratrabalho, como “malhar”, cuidar do pet e outras, com as profissionais.

Grupo 3. Entre os mais jovens e os seniores está o “miolo”. Esse grupo sofre o impacto dos outros dois e em geral seus filhos são crianças ou adolescentes. Um parêntese: temos aqui um terreno pantanoso. A quem cabe a responsabilidade de cuidar da casa e dos filhos? Se teoricamente, na sociedade contemporânea, ela é dividida entre pai e mãe, na prática há nuances que é preciso encarar. As mães ainda se cobram, e são cobradas, mais do que os pais, e o impacto da cultura nacional deve ser inserido nessa discussão. Se mães e pais querem, legitimamente, estar mais próximos dos filhos, há uma mudança silenciosa para privilegiar as necessidades individuais vis-à-vis às organizacionais. Cuidado! Muitas vezes, até inconscientemente, contorce-se o raciocínio para sustentar argumentos que dão conforto pessoal, e não organizacional.

Certo ou errado? Não cabe julgar. Cada um tem seu direito de escolha e o dever de conhecer as consequências, positivas ou negativas. É preciso adaptar-se aos novos tempos, compreender que o mundo mudou, e muito, e ter ciência e arte para separar o que é clássico do que é velho, o que é novo do que é apenas modernoso, a tendência contemporânea da acomodação individual. Consciência individual, ciência e arte: fique de olho nas suas escolhas!

Imagem: Pexels.com