18 dez, 2020

Por Angela Vega

Mudanças: pequenas e grandes mortes

Participei recentemente de um evento, o que não é novidade para os que me conhecem. Estou sempre em busca de novos conhecimentos ou de aprofundar os existentes. O tema foi recebido com estranheza e espanto por alguns: a morte. O título do evento em latim, Ars Moriendi, que pode ser traduzido por A Arte de Morrer, dizia respeito a um texto da Idade Média (século XIV) chamado Livro Cristão dos Mortos. Era um retiro de silêncio e meditação, conduzido por Jean-Yves Leloup.

Quando falamos em morte, pensamos na derradeira, inexorável para a qual caminhamos e que será a maior mudança que acontecerá em nossas vidas. Dizia a placa na porta do cemitério do documentário com o mesmo nome: “Nós que aqui estamos por vós esperamos”.

Podemos também pensar nas “mortes” diárias que vivemos. Quando nossos contextos mudam. Quando relacionamentos se rompem. Quando perdemos um ente querido. Quando deixamos a empresa após a aposentadoria. Quando somos despedidos. Quando nos desidentificamos com nossa autoimagem. Mudanças, perdas, mortes.

E para cada morte dessas é importante vivenciar o luto. Fazer o trabalho do luto. Qual trabalho precisamos fazer para aceitar o inaceitável? nos perguntava Jean-Yves.

Foi também comentado que, em Genebra, na Suíça, ocorre o maior número de suicídios de aposentados. Provavelmente ocasionados pelo fato de não terem vivido o luto da transição pela perda da identidade que tinham com seus locais de trabalho, com suas empresas.

O trabalho do luto implica em aceitar que o passado é passado. Não quer dizer que vamos esquecer. Enquanto vivemos no passado, estamos impedidos de viver o presente. E o luto não acontece por si só. Demanda de nós um envolvimento e um mergulho.

Se escolhermos viver o trabalho do luto para essas “mortes” diárias, para as mudanças que acontecem em nossas vidas, certamente sairemos interiormente fortalecidos.

Para o trabalho do luto, podemos reconhecer onde estamos, por meio dos sete estágios identificados pela médica Elisabeth Kübler-Ross, em sua vasta experiência acompanhando pessoas com doenças terminais, que são os seguintes:

1. Negação – a não aceitação do que está acontecendo;

2. Culpa – busca de culpados ou de culpar-se a si mesmo pelo que aconteceu;

3. Revolta e Raiva – expressão de sentimentos pelo fato acontecido;

4. Barganha. Promessas – prometer algo se a situação mudar, melhorar;

5. Depressão – momentos de grande solidão, vivendo em um passado idealizado;

6. Aceitação – aceitar que o passado passou.

7. Reconstrução – atitude de atenção e presença. Aceitar que a pessoa ou a situação não faz mais parte do nosso presente. Voltamos a ser nós mesmos, retomamos nosso lugar na sociedade com mais lucidez e maturidade.

Considerando esses estágios, podemos perceber que o trabalho do luto precisa de tempo.

E você? Qual morte está vivendo em sua vida? Em que estágio, você se percebe?

Para saber mais:

Além da luz e da sombra: sobre o viver, o morrer e o ser – Jean-Yves Leloup – Ed. Vozes

A morte é um dia que vale a pena viver – Ana Claudia Quintana Arantes – Ed. Casa da Palavra

A Morte: um amanhecer – Elisabeth Kübler-Ross – Ed. Pensamento