27 jan, 2021
Por Betania Tanure
Adaptar-se a uma empresa doente é uma doença
Se sua empresa está doente e você se adapta passivamente a essa situação, você adoece. No seu relacionamento social ou afetivo não é diferente.
Essa grave condição denominada covid-19 tornou visível para olhos cuidadosos outra doença, surda e sub-reptícia, que se desenvolveu na sociedade e, atenção!, em grande parte das boas organizações. Refiro-me à “síndrome do espectador”, que reflete e amplia a energia da insatisfação, da reclamação e da acomodação à “doença”.
Tal síndrome é alimentada pela mistura de dois fortes traços da cultura brasileira: a forma de lidar com o poder, reverenciando-o, e a alta importância das relações pessoais, com seus conflitos e discórdias abafados para manter a suposta harmonia.
Nos corredores de muitas de nossas empresas, as pessoas reclamam das decisões tomadas. O clima é de “isso não vai dar certo”. Por outro lado, não se desafia o status quo, o poder é “inconfrontável”.
Chega de reclamar. Chega de apegar-se ao diagnóstico e desprezar a premente necessidade de buscar soluções – um apelo tão vocalizado pela empresária Luiza Trajano. Chega de discutir se são 5 graus para a direita ou para a esquerda. Chega de exaltar a capacidade de adaptação à doença, espelhada em máximas como “a gente se acostuma com tudo”. Chega de esperar que a agressividade da situação atinja níveis desumanos e só então mobilizar-se, como ocorreu em de Manaus nos últimos dias.
Busque a clareza da percepção de que, em todos os casos, uma de suas responsabilidades é tratar a doença, tratar a sua doença e buscar saúde e vitalidade. É hora de você agir, estrategicamente, é claro, construindo pontes e usando os tratamentos necessários, sejam homeopáticos, alopáticos ou, por vezes, “cirúrgicos”.
Escolha os seus grupos de afinidade – de valores, de visão de mundo. E aja! Reclamar sem buscar a cura é infantil, é imaturo, é inconsequente – e chato!
A pergunta que sempre fica no ar é: “eu tenho poder para isso?”. Essa dúvida acomete presidentes, conselheiros, executivos, gestores…, limitando ações transformadoras.
Sempre se fala que para transformar a cultura de uma empresa é preciso que o topo participe do jogo. Vamos analisar dois pontos importantes relacionados a essa “crença”.
Ponto 1. Ilude-se quem acredita que todos os executivos do topo devem estar no mesmo passo para que se dê a transformação. Isso pode bem ser uma desculpa para não se transformar, permanecer na reclamação e na inércia.
Ponto 2. Muitos acham que por não estarem no topo nem tão perto dele, seja na empresa, seja em algum poder da República, resta esperar que “eles” se iluminem. Mentira! Esperar é a única coisa a não fazer. Trace uma estratégia de influência. Se bem arquitetada e executada, ela ampliará o nível de consciência da necessidade de mudança e desenvolverá novas competências para girar a roda da transformação.
Se você acha que é muito trabalho para pouco sucesso, lembre-se de que acomodação e evolução não se combinam. Mova-se. Repense a estratégia, reconstrua pontes, fuja da postura de espectador.
Não espere a situação “pegar fogo”. Não perca o brilho nos olhos. Não se deixe transformar em um “reclamão”, uma “reclamona”, de plantão. Não restrinja ao diagnóstico suas maiores habilidades.
Vários de nós – você incluído, espero – estamos em movimento na busca de soluções para a dramática situação representada por Manaus. Mas não é suficiente. Desde a imagem da primeira pessoa que recebeu a vacina cresce a esperança e a certeza de que a imunização se concretizará, no Brasil e no mundo. Mas ela não pode obscurecer a premência das mudanças estruturais. É preciso articular formas de evitar uma ruptura social, nas empresas e na sociedade.
Tem-se como saída a assunção, por parte da sociedade civil, do seu papel de autora, e não de espectadora, da história.
A hora é agora. É início de ano, a crise da pandemia já atinge níveis insuportáveis e reacendeu a esperança. Faça deste momento a alavanca para vencer resistências, para ter coragem e abandonar de vez a inércia! Como indivíduo, como organização, como cidadã ou cidadão. Chega de se adaptar à doença!