16 abr, 2021

Por Betania Tanure

“Navegar é preciso, viver não é preciso”

Momento de rever comportamentos na vida e na empresa

Desnecessário falar do ritmo acelerado das mudanças. Desnecessário deter-se na análise do nível de exaustão das pessoas potencializado pela instabilidade e da incerteza. Exaustão, sofrimento, medo. Esses sentimentos se refletem no ambiente empresarial, inclusive nas relações virtuais. Não finja que não existem, isso seria inútil e contribuiria para torná-los ainda mais fortes.

Também não tenha a expectativa de que as pessoas se comportem de modo preciso, ou seja, que acertem “na mosca”. No atual cenário, o comportamento das pessoas não é sequer previsível, por que seria preciso? Aprenda a navegar em mares revoltos e ainda desconhecidos, a percorrer um caminho ainda em construção. E, importante, não negue os riscos. A alternativa a essas escolhas é a morte. Viver é, sim, necessário, mas não é preciso. A vida é, por natureza, repleta de incertezas, hoje dramaticamente potencializadas.

Partindo dessa premissa, é fundamental lembrar que, nas empresas, uma importante âncora de estabilidade neste momento profundamente instável é a cultura organizacional. A cultura é o fio terra, é por onde as pessoas navegam quando têm problemas.

A cultura organizacional indica de que forma a empresa soluciona seus problemas e como supostamente as pessoas agem e reagem. Contribui, assim, para que as pessoas sintam a segurança que os valores fundamentais dão a qualquer um de nós, nas famílias, nas organizações, na sociedade.

Procure lembrar-se de como era seu comportamento, ou de seu filho, na juventude: provavelmente rebelde, muitas vezes, diante de regras estabelecidas, calcadas em valores. Hoje você sabe, e sabemos todos, que os valores dão segurança sobre o que é certo e o que é errado. E que esse fio terra até nos possibilita voar mais alto. Os valores, a cultura são também redutores de ansiedade: dão caminhos e as pessoas tem a sensação, rara hoje em dia, que no final vai dar certo. Hoje os líderes, os pais estão sem condição real e emocional de afirmar: “isso vai passar já, vai dar certo”. Estamos, portanto, no momento mais dramático que mostra que viver é muito, muito impreciso.

Por isso, acorde! É hora de ser preciso e rigoroso na disciplina do isolamento social contribuindo para diminuir a tragédia e a dor. Acorde! Pare de pôr no outro a responsabilidade pelos desacertos, saiba discernir o que está no seu campo. Acorde! É hora de mudar alguns dos traços da cultura da sua organização! E lembrar que os traços saudáveis dão estabilidade. Em pesquisa que fizemos há cerca de duas semanas, a nota média da cultura organizacional foi 7. Ou seja, passa-se na prova, mas “raspando”: é o subdesempenho satisfatório que você não pode aceitar.

Acorde! Um dos principais traços a mudar relaciona-se ao esforço versus resultado. É hora de enfrentar o mau humor do seu liderado que não recebeu o desejado bônus depois de um ano de tanto esforço. Premiar esforço é um dos traços mais indesejados, segundo os executivos – que, atenção, são os que arbitram para que o bônus ou a avaliação privilegie o esforço.

É hora de compreender verdadeiramente que a valorização do esforço se sustenta em quão relacionais somos no Brasil, em que nível desejamos ser queridos, por vezes abrindo mão de fazer o que é certo, de ser implacáveis com os pequenos e os grandes delitos.

Acorde! Para os povos relacionais como o brasileiro, é muito mais difícil cumprir o  isolamento do que em países individualistas, como a maior parte dos anglo-saxões. Mas isso nos dá o direito de não cumprir o combinado? Não, não dá.

É em períodos de “guerra”, como a que vivemos hoje, que se distingue o que vale do que não vale, ou seja, que se identificam os valores verdadeiros e não apenas a “conversa fiada”. Então a hora é agora. É hora de cultivar a vida, é hora de viver. A ação, o fazer bem, o fazer o bem, tudo isso sustentado pela esperança, nos levam a uma belíssima viagem, nos ajudam a enfrentar as turbulências de mares tão revoltos sabendo que navegar é preciso e viver não é preciso.