23 maio, 2023

Por Angela Vega

Idadismo: o que eu tenho a ver com isso?

“A idade é a única categoria social que identifica subgrupos aos quais todos podemos eventualmente ingressar.” (M. S. North & S. T. Fiske)

No final da década de 1960, duas pessoas de diferentes gêneros e formações, separadas por um oceano, escreveram sobre a forma como as pessoas idosas eram tratadas.

Simone de Beauvoir, mulher, francesa, 61 anos (em 1969), intelectual e filósofa existencialista, escreveu o livro “A Velhice”, no qual apresenta a evolução da ciência que estuda a velhice (gerontologia) e analisa como as sociedades “primitivas” (estudadas pela Antropologia e sem contato com a civilização) tratavam os seus membros mais velhos. No livro, a autora também mostra a forma de tratamento das pessoas mais velhas, a partir de poetas e escritores, analisando extratos de seus textos, nos quais falavam da velhice.

Robert N. Butler, homem, norte americano, 42 anos (em 1969), médico, gerontologista e psiquiatra, escreveu um artigo sobre suas impressões acerca das reações das pessoas da comunidade do entorno (em Washington, EUA) ao saberem que um edifício próximo seria destinado a receber pessoas idosas. Para expressar o “fenômeno” observado, ele cunhou a palavra “age-ism”, juntando a palavra “age” (idade) ao sufixo “-ism” já usado em outras palavras que designam preconceitos ou movimentos (racismo, sexismo, feminismo etc.). No texto, o autor comenta sobre o preconceito em relação às pessoas idosas, mas registra a possibilidade de outras faixas etárias, por exemplo, os jovens, também serem vítimas dele.

Em português, várias palavras vêm sendo usadas para expressar essa condição: ageísmo, etarismo e idadismo.

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) escolheu a palavra idadismo ao emitir o Relatório Mundial sobre o tema, registrando que “o idadismo se refere a estereótipos (como pensamos), preconceitos (como nos sentimos) e discriminação (como agimos) direcionadas às pessoas com base na idade que têm.”

Por que o idadismo está cada vez mais presente e visível? A explicação pode ser dada pela demografia e pela longevidade. O Brasil acompanha a tendência mundial de crescimento da faixa 65+ (pessoas acima de 65 anos) que é proporcionalmente maior do que as curvas relacionadas às outras faixas etárias. As projeções indicam que, por volta de 2030, a população de 65+ ultrapassará a faixa de 15 a 24 anos e, em 2040, a faixa de 0 a 14 anos; ocorrendo uma inversão, com mais idosos compondo a população do que crianças (0 a 14 anos).

A expectativa de vida ao nascer saltará de 73,4 anos em 2022, para 79,9 anos em 2062, configurando um aumento aproximado de 10%. Em relação à expectativa de vida aos 80 anos, em 2022 projeta-se um valor de mais 6,7 anos e em 2042, mais 8,4 anos. Esses valores estão relacionados ao aumento da longevidade e implicam no crescimento do quantitativo de pessoas acima de 60 anos na distribuição da população. Em consequência, pode-se esperar que o idadismo fique cada vez mais visível, porque poderá atingir um número maior de pessoas. Ainda segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), a população do Brasil apresentava em 2022, uma idade média de 33,2 anos, sendo que daqui a 20 anos (em 2042), esse valor será de 41 anos, demonstrando um envelhecimento da sociedade brasileira.

E o que nós temos a ver com o idadismo? O preconceito relacionado à idade pode ter um impacto significativo na economia e na sociedade em geral. Segundo alguns estudos apresentados no Relatório Mundial da OPAS, o idadismo custa bilhões de dólares à sociedade todos os anos, uma vez que retira milhões de pessoas da população economicamente ativa e limita a sua possibilidade de geração de valor. No convívio social, a linguagem pode ser fonte de expressão de estereótipos e preconceitos (ver artigo “Encarando os estereótipos e preconceitos para evitar a discriminação”). No Brasil, vários itens do Estatuto do Idoso foram alterados por projeto de lei em 2022, inclusive o nome que passou a ser Estatuto da Pessoa Idosa, evitando-se o rótulo.

A resposta para evitarmos o idadismo está em nossas mentes, corações e mãos. À medida que elevamos nosso nível de consciência poderemos passar a perceber quando pensamos de forma estereotipada, quando os preconceitos se manifestam em nossos sentimentos e quando agimos de forma discriminatória.

Referências:
. Simone de Beauvoir. A velhice. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2018.
. Richard N. Butler. Age-ism: Another form of bigotry. The Gerontologist, v. 9, p. 243–246, 1969.
. Relatório Mundial sobre o Idadismo – OPAS:  https://iris.paho.org/handle/10665.2/55872
. Artigo “Encarando os estereótipos e preconceitos para evitar a discriminação”
. Gráfico (fonte): https://population.un.org/wpp/
. Imagem: Gerd Altmann por Pixabay