17 ago, 2023

Por Betania Tanure

Há um risco em ficar e não sistematizar seu legado

A colunista Betania Tanure escreve sobre a necessidade de equilibrar a inquietação saudável dos empreendedores e fundadores com a coragem de profissionalizar a gestão

Fundador, fundadora, acalme sua alma! Mas não perca velocidade. Você nunca será ex- fundador, ex-fundadora, mas uma empresa pode desaparecer ou perder relevância se quem a criou não souber passar para a próxima etapa no momento certo – e isso vale para as gerações seguintes.

Temos pesquisado e trabalhado com organizações familiares que querem perpetuar o legado de quem as criou e da segunda geração e da terceira… À medida que o tempo passa, o desafio aumenta.

Não por acaso, a alma de quem funda uma empresa, assim como a do empreendedor, da empreendedora, é inquieta. Lidam com os problemas de modo fundamentalmente diverso, em comparação ao executivo, à executiva ou à sua maioria. Isso pode ser maravilhosamente complementar ou fonte de fricção e desentendimentos cotidianos, que geram um gosto amargo nas relações. Mais: pode paralisar a organização, desorientar pessoas, inverter o ritmo de crescimento e de resultados empresariais, muito além dos financeiros.

Tem sido interessante encontrar executivos e executivas, poucos é verdade, com alma de fundador, de fundadora – e, por que não dizer, fundadores e fundadoras com alma executiva.

Muita atenção para uma diferença basilar revelada em nossas pesquisas: quem tem “alma empreendedora” tem faro e olho agudo para detectar problemas e, ao achá-los, pode avançar em seu objetivo e resolvê-los, ainda que de forma inédita. Já quem tem “alma executiva” sabe encontrar com maestria a solução para os problemas e, com método, processos e boa capacidade de gestão, resolvê-los.

Muitas pessoas da esfera de gestão revelam ter a incômoda sensação de que as almas empreendedoras estão sempre insatisfeitas e que isso gera o sentimento de menos valia nos que estão ao seu redor. Segundo essa percepção, ignoram-se os avanços e nunca se recebe o merecido elogio.

O fato é que tal “insatisfação” tem suas origens mais profundas na positiva ambição de crescimento, nas oportunidades. O objetivo é encontrar caminhos ou soluções para problemas que muitos nem sequer percebem ou que empurram para debaixo do tapete, o que é inadmissível para o fundador, a fundadora, assim como para o empreendedor, a empreendedora.

Aqui é necessário um alerta de perigo máximo! Por vezes, só se acredita que é necessário fazer um trabalho com método quando já é tarde, já se está perdendo a alma, o legado está em risco. Não se percebeu a tempo que os braços já não abraçam todas as pessoas e que os olhos já não enxergam tudo o que acontece. Isso vale não só para a sucessão de fundadores e fundadoras mas também para as empresas que crescem muito rapidamente, de forma orgânica ou, em especial, através de M&A.

Acalme a sua alma e, ao mesmo tempo, mantenha aquela inquietação saudável e a coragem de, em algum momento, sistematizar o seu legado. Sem medo da finitude, encare o fato de que você não é eterno, você não é eterna. Isso contribuirá para preservar o seu legado através do tempo.

Não minimize o risco de deixar que o processo aconteça naturalmente. O seu legado, a sua empresa, pode simplesmente desaparecer!

Imagem: Unsplash