Qual é a vacina que vai mesmo nos “salvar”?

Qual é a vacina que vai mesmo nos “salvar”?

A colunista Betania Tanure diz que, mais do que adivinhar quando o ‘novo normal’ chegará, profissionais precisam cultivar o autoconhecimento e avaliar as atitudes frente ao outro.

 

Dúvida zero de que a primeira resposta intuitiva à pergunta-título é “a CoronaVac”, de origem chinesa, ou “a de Oxford”, Reino Unido, ambas em fase avançada. Mas não é delas que vamos tratar. Nosso tema é outro tipo de “vacina”.

Inicio com um alerta sobre uma expressão muito usada e que me inquieta: “novo normal”. O termo revela a necessidade, muitas vezes inconsciente, de estabilidade, de algo que expulse as incertezas de nossas vidas. Receio ter de enfatizar que esse “novo normal” como símbolo de uma fantasiosa estabilidade não virá. Essa “vacina” não foi, nem será, produzida. Ao mesmo tempo, o fato de viver na incerteza absoluta e sob restrição de afeto social está enlouquecendo as pessoas. Muitas estão mais deprimidas, agressivas, irritadiças, exaustas e mais dependentes de bebidas alcoólicas e medicamentos. É o que nossas pesquisas revelam. Acostumar-se a viver só não se traduz em aprender com a solidão – e pode contribuir para o aumento do grau de egoísmo entre as pessoas.

Mas, afinal, como nos imunizar contra esses males? Com a “vacina do autoconhecimento”. Não há modo mais efetivo de aprendermos a vencer o alto nível de exaustão e a irritabilidade que vivemos hoje. O problema é sempre o outro. O chefe, o colega, o parceiro afetivo… O autoconhecimento permite a cada um de nós fazer as escolhas corretas na vida, nos mais vários âmbitos. Temos de arregaçar as mangas e reaprender a liderar a nós mesmos, para então liderar outras pessoas!

O primeiro passo é se observar criticamente, buscar a consciência e o domínio de si mesmo. Atingimos o autoconhecimento quando desenvolvemos a clara percepção dos nossos impulsos, conflitos, sentimentos e emoções. Nesse processo, é fundamental aprendermos a “descongelar” certos comportamentos e aceitar o desafio de mudar. Sem isso, não atingimos o controle da própria vida e, portanto, não temos as condições básicas para avançar.

Há uma segunda “vacina” que, como seres sociais e cidadãos, devemos tomar: a cívica. É verdade que nunca se viram no Brasil tantos atos de doação, de todo tipo, estimulados pela consciência da responsabilidade, embora, por vezes, pelo medo. Esse é um dos ingredientes da vacina cívica, mas apenas um. A pergunta: tais atos são conjunturais ou estruturais? Ainda que sejam apenas conjunturais, é certo que devemos comemorá-los, reforçando a necessidade de avançarmos em comportamento como cidadãos responsáveis. Somente com essa consciência poderemos, como sociedade, voltar o olhar para o genuíno interesse coletivo vis-à-vis aos interesses setoriais ou particulares da empresa, e mesmo das pessoas, em âmbito profissional ou individual.

A vacina cívica, que vai muito além da doação, ou do pagamento de impostos, mas os inclui, prioriza ações e comportamentos responsáveis com o outro. Isso significa estimular a busca do bem comum. Significa abrir mão da satisfação de desejos individuais em prol do bem da sociedade. No atual cenário de eleições, significa exercer seu direito de cidadão com a consciência de que sua escolha, seu voto, deve representar o bem da maioria. Significa que o ódio deve ceder lugar à esperança de construir, a partir da diversidade, um mundo mais ameno, de mais união.

Pense: seja em âmbito pessoal, familiar, profissional ou social, quantas vezes você age buscando a sua satisfação, descolando-a do efeito sobre o outro? Essa é uma pergunta que só você pode responder. Você investe o tempo necessário na criação de estratégias e alternativas para acabar com as vergonhosas diferenças sociais que a pandemia escancarou? Você estimula a união tirando o oxigênio da crítica e da raiva? Se a resposta é negativa, apresse-se. Este é o momento de tomar as duas vacinas, aqui e agora.

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