Aprendizado em escala

Aprendizado em escala

Em um mundo que se transforma rapidamente, com novas dinâmicas de negócios e demandas dos clientes, os métodos tradicionais não são mais uma garantia de sucesso. As organizações precisam redefinir suas estratégias de crescimento, seus modelos de negócios e até mesmo a própria noção de trabalho para acompanhar as mudanças e prosperar. Para John Hagel, diretor do Center for the Edge da Deloitte, localizado no Vale do Silício, e membro da Singularity University, o segredo está em mudar o foco da eficiência escalável para o aprendizado escalável. Hagel falou sobre esses desafios à Mundo Corporativo durante sua última visita a São Paulo, quando participou da edição 2019 do SingularityU Brasil Summit, patrocinado pela Deloitte.

A transformação a partir das “bordas” é um tema frequente em seus artigos e palestras. Como as empresas devem endereçar essa questão?

Nosso foco é na inovação e na transformação que vêm das bordas para superar desafios. Para a maioria das organizações, inovar significa criar um produto ou serviço diferente para expandir ou conquistar novos mercados. A transformação, no entanto, remete a questões mais básicas sobre o verdadeiro negócio central da empresa – ou em qual negócio ela deveria focar? O que deve ser revisto e retrabalhado para apoiar de fato esse posicionamento? A transformação é muito mais desafiadora, pois obriga a questionar e mudar tudo. Nesse contexto, a melhor maneira de impulsionar a transformação em grandes organizações é pelas bordas. Isso significa identificar uma área que seja relativamente modesta em termos de faturamento ou lucros para a empresa, mas que tenha o potencial de crescer ao ponto de se tornar o novo core do negócio, desde que seja possível compreender as forças exponenciais que estão por trás das mudanças. Não se trata apenas de ter um faturamento extra ou novas iniciativas. Trata-se de conduzir a transformação escalando uma ponta, ao invés de transformar toda a organização de uma só vez.

Quais são os principais pontos de atenção ao seguir esse modelo?

Uma das recomendações é que as empresas encontrem uma borda que seja complementar ao negócio existente, para evitar que as atividades concorram entre si. Idealmente, você terá uma nova fonte de renda e lucros, ou ainda novos serviços para os clientes. A competição com o core business costuma gerar resistência por parte do resto da organização – o instinto natural é querer acabar com o concorrente. Por outro lado, há uma oportunidade latente em tempos de rápidas mudanças, para reestruturar mercados e indústrias inteiras, de forma a criar muito mais valor e oportunidades para a empresa e para seus clientes.

É preciso ter uma visão de longo prazo para realizar esse tipo de transformação. É necessário um planejamento para quantos anos?

Esta é a principal dificuldade nessa mentalidade. Nós desenvolvemos uma abordagem chamada “zoom out / zoom in”. O “zoom out” consiste em olhar para frente, projetar como será sua indústria daqui a 10 a 20 anos e visualizar quais os tipos de empresas ou de negócios que terão sucesso no futuro. Essa é uma visão a longo prazo, mas é preciso também analisar o que acontece agora. E imagine que há algo incipiente hoje que, dadas as mudanças que ocorrem no mercado, tem o potencial de escalar para se tornar o principal foco do negócio em um cenário mais distante. Chamamos essa parte de “zoom in”. Trata-se de um movimento contínuo – olhar para um futuro ainda longínquo e detectar as próximas oportunidades de negócios para implementar as transformações necessárias para chegar lá, sem perder o foco no presente.

Qual é o elemento-chave para prosperar nesse novo ambiente de negócios?

No passado, os negócios bem-sucedidos eram impulsionados por um modelo de eficiência escalável, era preciso ter cada vez mais eficiência em grande escala para ter êxito. Em um mundo de transformações mais velozes, esse modelo tradicional já não funciona tão bem. A eficiência tem retornos limitados – quanto mais eficiente é seu negócio, mais difícil é alcançar o próximo patamar de eficiência. Ironicamente, quanto mais bem-sucedido você é, menos chances tem de prosperar ainda mais. Com as rápidas mudanças que acontecem na economia em todo o mundo, o segredo é aprender mais rápido. Quem se contentar somente com o que fazia no passado, ficará cada vez mais desconectado das mudanças que acontecem lá fora. É preciso conhecer as transformações que estão acontecendo e entender o que é necessário para criar mais valor nesse contexto. As empresas que terão mais sucesso no futuro serão aquelas que focarão o que chamamos de aprendizado escalável – ou seja, aprender mais rápido de forma exponencial e entregar mais e mais valor para o ambiente de negócios. Esse modelo propicia retornos potenciais crescentes, pois, quanto mais você aprender, mais valor oferecerá aos negócios. É um desafio crucial passar da eficiência escalável para o aprendizado escalável.

Como as indústrias tradicionais estão respondendo a essa realidade?

A maioria das organizações sofre uma pressão constante dos investidores para crescer mais rápido e a discussão costuma focar duas opções: investir na empresa e crescer organicamente ou realizar uma grande aquisição para estimular o crescimento. Há, no entanto, uma terceira alternativa, que é mobilizar terceiros para gerar cada vez mais valor para seus clientes e coletar parte desse valor. Nesse modelo, a empresa captura valor ao orquestrar esses ecossistemas, em vez de comprar outros negócios ou fazer tudo sozinha. É uma forma poderosa de crescimento, a qual a maioria das empresas nem considera. A oportunidade está em encontrar maneiras de participar de plataformas em que você consiga alinhar as pessoas certas, com os recursos necessários e na melhor hora para atender a qualquer que seja a demanda atual. Trata-se de uma forma bastante diferente de conduzir os negócios.

A indústria da moda evolui rapidamente para esse modelo. Nós passamos algum tempo estudando uma empresa na China que trabalha com designers e marcas de roupas globais. Eles basicamente coordenam todos os recursos para cada etapa de produção – da matéria-prima à logística de distribuição em todo o mundo – e fazem isso com tamanha flexibilidade que estão prontos para responder quando a demanda muda. Para isso, criaram uma plataforma global de 15 mil parceiros de negócios, com participantes de perfis distintos. A chave está em conseguir conectar conhecimentos e capacidades com agilidade e flexibilidade, onde e quando for necessário.

A maioria das empresas parece ter pressa em adotar novas tecnologias para acelerar a inovação. Como você vê o futuro do trabalho nesse cenário?

Computadores e algoritmos podem, de fato, desempenhar tarefas padronizadas e integradas com muito mais eficiência do que nós, humanos. Eles não erram, não ficam doentes e não se distraem. Nós acreditamos que as máquinas assumirão toda essa parte. E essa é uma ótima notícia, pois significa que nós podemos dar um passo para trás e redefinir a noção de trabalho, para que cada pessoa dentro da organização possa se concentrar em endereçar problemas e oportunidades inéditos e criar cada vez mais valor. Profissionais de todas as áreas das organizações são constantemente confrontados a novas situações que apresentam diferentes problemas, desafios e oportunidades para criar mais valor, mas eles não têm tempo de cuidar disso, pois estão focados em tarefas rotineiras.

Nós precisamos liberar tempo para tratar dessas questões, com as qualidades que nos tornam únicos – como curiosidade, imaginação, criatividade e inteligência emocional. A inteligência social redefine o trabalho fundamentalmente para as pessoas, mas propicia um valor imensurável para as instituições. Como seres humanos, nós temos um conjunto infinito de necessidades potenciais. Assim que nossas necessidades básicas são satisfeitas, surgem outras. Ao transpor isso ao nosso comportamento como consumidores, percebemos que sempre teremos uma vontade nova a ser atendida. O desafio e a oportunidade para as empresas envolvem incentivar seus profissionais a detectar essas novas necessidades, para que eles possam se concentrar em criar valor para a organização, para os consumidores e para eles mesmos, enquanto atingem todo o seu potencial.

Como os líderes estão lidando com essas mudanças?

Eu acredito que há uma percepção crescente de executivos ao redor do planeta de que o mundo está mudando de uma forma que eles não entendem completamente. Parte da necessidade envolve aumentar a conscientização sobre os impactos dessas transformações. Existe também o medo de assumir riscos. Inovar implica tomar caminhos desconhecidos e há sempre riscos associados à inovação. As grandes empresas têm a cultura de minimizar riscos. No Center for the Edge, centro de estudos da Deloitte no Vale do Silício, nós analisamos as forças que estão remodelando a economia e diminuindo a eficácia dos métodos tradicionais de atuação. As organizações têm de capturar as novas oportunidades que surgem dessas mudanças. Elas precisam ser inovadoras, precisam trabalhar como nunca fizeram antes e encontrar novas maneiras de criar valor – e isso requer inovação.

 

Fonte: https://mundocorporativo.deloitte.com.br/aprendizado-em-escala/

 

Vida 3.0: como continuar humano na era da inteligência artificial?

Vida 3.0: como continuar humano na era da inteligência artificial?

 

Esta pergunta é cada vez mais relevante, mas não a inventei: ela é o título do livro de Max Tegmark, editado em 2017 e um dos vários publicados mais recentemente sobre a temática da Inteligência Artificial e seu impacto na sociedade humana.

Max me fez lembrar do que senti quando li, nos anos 80, pela primeira de muitas vezes, “Eu, robô”, de Isaac Asimov, publicado em 1950. Como antropóloga, me fascinou a imaginação de Asimov ao projetar, antes da existência das atuais tecnologias digitais, uma sociedade em que robôs poderiam se tornar inteligentes a ponto de controlar os humanos.

Com o desenvolvimento da Inteligência Artificial, muitas das fantasias de Asimov já estão materializadas. E Max aprimora esta ficção ao descrever robôs ultrainteligentes que se reprogramam e se superam, e criam versões cada vez mais incríveis de si mesmos em curtos espaços de tempo. E descreve as consequências para uma sociedade que vai perdendo para estes seres poderosos e ultra-ágeis a sua velocidade de se reinventar.

São dois autores geniais, separados por muitas décadas de revolução tecnológica, mas trazendo uma mesma inquietação: o que nos tornamos? O que nos tornaremos? E como nos preparar para isto, na velocidade em que já está acontecendo?

Estamos cercados de IA por todos os lados: ao buscarmos informação no Google, ao interagirmos nas redes sociais, comprarmos livros e outros itens na Amazon ou no supermercado virtual, ao conversarmos divertidamente com a Alexa ou com a Bia do Bradesco. A Inteligência Artificial está ali, e num estágio em que aprende sobre nós cada vez que com ela interagimos. E até mesmo nos ajuda em necessidades corriqueiras.

Precisamos, então, aprender sobre ela! Não é mesmo?

Ela nos afeta positiva e negativamente. Fez surgir novas profissões, e outras continuarão a surgir, diretamente ligadas à Inteligência Artificial.

E não vai afetar tanto as profissões que dependem das habilidades que “sobrarão” para nós, humanos: as que requerem sensibilidade social ou emocional, ou as que requerem tarefas humanas de alta complexidade e não repetitivas, como, por exemplo, algumas especialidades da medicina, da psicologia, da antropologia e… alta gastronomia. Pois, usando robôs, já é possível fazer sanduíches iguaizinhos uns aos outros.

Muitas atividades e negócios já estão se beneficiando de um dos lados fascinantes do uso da Inteligência Artificial: velocidade e precisão ao lidar com volumes imensos de informação, analisar dados e tendências, realizar estágios iniciais de recrutamento e seleção, e até mesmo com programas de treinamento que podem ser autoadministrados. Neste sentido, a IA é facilitadora. O outro lado é eliminar diversas profissões que são superadas em rapidez e qualidade por algoritmos e robôs bem programados.

E como preservar a nossa “humanidade”, nossa característica única de improvisação, adaptação a situações inesperadas, inovar?

A resposta está em construção. Começa por educar as novas gerações a aprender a pensar e a sentir, a criar e a se comunicar usando as novas tecnologias a seu favor. Continua pela reinvenção das gerações mais maduras, ao acompanhar o ritmo de mudança das tecnologias, para usá-las com seu aditivo único: experiência de vida, anos na estrada, visão mais ampla. Deixar a máquina fazer o trabalho pesado e assumir o trabalho criativo.

As organizações, cada vez mais, estão revendo as relações de trabalho, para um modelo mais colaborativo, de inspiração, de motivação, que premie a flexibilidade, a criatividade, a capacidade de cooperação e reduza cada vez mais a competição entre as equipes. Dando propósito aos colaboradores, estes crescem em suas atividades. Robôs não precisam disto, mas não são, ainda, bons em gerar empatia para as organizações.

E você? O que tem vivenciado no seu ambiente de trabalho com relação  a essa temática? Compartilhe sua opinião.